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(E)m estado líquido #30
Flui em cascata acariciando a pele, arrepiando-a, tornando-a susceptível a cada toque, a cada beijo deixado pela ponta de uns dedos ensinados e subjugados às curvas do corpo que se lhes oferece. Curvas que conhece de cor, que admira orgulhosamente sempre que despida se mostra disponível para si, aberta e pronta para o receber. Embaciam-se-lhe os olhos, deixam de ver, cegos de prazer, entregues ao calor que húmido e sarcasticamente refrescante lhes escorre do corpo como que antevendo fugidias lágrimas de paixão.
Smoking Hot (16)
Paro para pensar e penso que nunca antes pensei que me soubesse tão bem. Prostrada, encosto os ombros na almofada e sinto ainda o aroma da tua pele que se entranhou nela, que se entranhou em mim e me deixou como que hipnotizada, perdida no âmago das memórias dos momentos que até há instantes eram reais. Saíste de mim mas deixaste para trás o imenso calor que me enche o peito num bafo doce e almiscarado, num sussurrar acutilante que me invade os sentidos e me faz desejar que o tempo, esse eterno ditador, te-me conceda novamente.
Just do (me) #2
Falamos dialectos de paixão e sofredora ternura que inventámos e tornámos nossos à medida que os nossos corpos se acharam cada vez mais cientes um do outro. Falamos a linguagem dos enamorados em gestos doces, olhares desadequadamente demorados, enlaçar de dedos desinteressados apenas interessados no contínuo tocar, no contínuo manter das suas peles unidas. Falamos a língua dos amantes em trejeitos de loucura, em palavras delirantes e gemidos absurdamente sentidos, em prazeres sórdidos e brutais, em entregas unânimes e viciantes. Falamos em silêncio, em beijos profundos, em suspiros arfados, em amares contidos, em arrepios espontâneos, em orgasmos colossais. Falamos do que é nosso e do que somos, partilhamos o nós e o que queremos, falamos de amor, falamos de sexo, falamos do ontem e do amanhã na certeza que o hoje é nosso nos gestos e palavras da língua que criámos e da qual somos os melhores aprendizes.
State of the Mind (45)
"E o médico perguntou:
- O que sentes?
- Sinto lonjuras, doutor.
Sofro de distâncias."
Caio Fernando Abreu
Desaprendi a ter controlo sobre mim própria. Desaprendi a não sentir falta do corpo que me sacia, do sorriso que me abraça e me aquece o coração na mesma proporção que me incendeia a libido. Desaprendi a acautelar-me contra o peso das palavras que fogem da boca, desaprendi a fechar a porta ao infinito porque estava certa que o delimitado era suficiente. Desaprendi a não querer mais que o que posso ter, desaprendi a não desejar para além do desejo que me é permitido. Desaprendi a não ver na entrega perfeita dos corpos, apenas corpos. Desaprendi a evitar sonhar e entreguei-me ao sonho que vivo acordada e onde me mantenho desde que te aprendi.
(Ela) tem Caprichos Matinais LXXXIV
Hoje não tens querer. Não te dou essa opção. A tua liberdade é norteada pelo meu querer e eu hoje quero assim. Enlaço-te e algemo-te em mim e procuro sentir a tua língua hábil, quente e ardilosa a apoderar-se do prazer que cada lambidela me provoca. Quero que encontres o meu ponto de ebulição e me leves à quase loucura, aquela que me deixa a planar entre o celestial e o terreno, aquela que me transporta para lá do ser sem nunca tirar os pés do chão. Quero explodir na tua boca e oferecer-te o leitmotif que me permeia o corpo sempre que o invades, sempre que o tomas como teu.
State of the Mind (44)
Suponho que é assim que se sente. Acho que já não me recordava de como se sentia. Tão real e vívido, tão presente. Suponho que é assim que se sente quem sabendo o que sente não pode sentir.
"Anda, abraça-me, beija-me
Encosta o teu peito ao meu
Esquece o que vai na rua
Vem ser minha eu serei teu
Que falem não nos interessa
O mundo não nos importa
O nosso mundo começa
Dentro da nossa porta
Encosta o teu peito ao meu
Esquece o que vai na rua
Vem ser minha eu serei teu
Que falem não nos interessa
O mundo não nos importa
O nosso mundo começa
Dentro da nossa porta
Só nós dois é compreendemos
O calor dos nossos beijos
Só nós dois é que sofremos
As torturas e os desejos
Vamos viver o presente
Tal qual a vida nos dá
O que reserva o futuro
Só deus sabe o que será"
O calor dos nossos beijos
Só nós dois é que sofremos
As torturas e os desejos
Vamos viver o presente
Tal qual a vida nos dá
O que reserva o futuro
Só deus sabe o que será"
Tiago Bettencourt, Só nós dois.
Oh Sweet Idleness
Acharam o refúgio que julgavam já não existir. Os cotovelos que lhe descansam no peito, as mãos que desinteressadamente lhe percorrem a pele, os pés que se enlaçam num sorrir jocoso, o olhar terno que depositam um no outro, as palavras doces que soltam entre suspiros e abraços apertados com a força que lhes vem do querer prolongar ao máximo a sua estadia. Acharam no corpo que se lhes oferece o descanso e a luta. Tão depressa coexistiam pacificamente, lânguida e arrastadamente como rebolavam intensa e incessantemente no sexo e prazer que sabiam ser esmagadoramente incomparável. Acharam o lugar onde, se a vontade lhes fosse feita, permaneceriam sem fim e onde se debelariam sem tréguas contra o que lhes é contra.